quinta-feira, dezembro 27, 2007

Uma primeira avaliação ao Plano Tecnológico, ao Simplex e às Novas Oportunidades

“ Três programas emblemáticos caracterizaram este Governo: o Plano Tecnológico, o Simplex e as Novas Oportunidades. O que de melhor o Governo Sócrates fez, passou por aqui. Talvez, de todos, o Simplex tenha sido o que melhores resultados trouxe. Ainda é cedo para se fazer uma avaliação global, mas a simplificação burocrática conheceu um impulso sério.

O Plano Tecnológico traduz muito do deslumbramento de Sócrates e da sua geração pelo poder das tecnologias, e pela crença de que as tecnologias têm efeitos sociais de per se. Não têm. São instrumentos que só actuam em contextos sociais próprios e muitos milhares de euros de material avariado, computadores, gadgets estão por essas escolas e instituições públicas onde, depois de belas sessões públicas de ofertas e inaugurações, não se cuidou, por exemplo, da manutenção. Para além disso, ter banda larga em Ferreira do Alentejo é excelente se ela servir para alguma coisa, se as literacias para a usar existirem para além da ida à Internet para ver os sítios de futebol, pornografia e as fotografias da turma no hi5.
Terá ainda que se esperar para ver outros resultados do Plano Tecnológico, mas este perdeu dinâmica no último ano.

Quanto às Novas Oportunidades, foram no seu início um sucesso naquilo que era mais difícil: revalorizar o papel do ensino, da educação, da aprendizagem, do saber, em sectores da população que na sua vida tinham voltado as costas a esses valores, por necessidade ou por facilidade. Porém, o programa entra agora numa fase crucial: após os momentos de arranque inicial, é suposto que se comece agora a aprender e a ser avaliado. Essa é a parte mais difícil, mas a que justifica o projecto. E aqui as intenções iniciais começam a esmorecer, os atrasos a somarem-se, a perplexidade dos formadores a aumentar e o anúncio regular pelo Governo da outorga de mais uns milhares de diplomas faz suspeitar de facilitismo. Vamos ver”.

Pacheco Pereira
Revista Sábado

quinta-feira, dezembro 20, 2007

A Escola e o mundo perfeito

"O presidente da República sonha, como todos nós, com um mundo perfeito. Por isso, neste fim-de-semana, não só defendeu que os governantes devem ouvir o povo (está em causa a relação entre o Ministério da Educação e os professores), como insistiu que os problemas da educação não se resolvem com a baixa dos critérios de exigência e rigor na avaliação. O exemplo da matemática serviu-lhe que nem uma luva "A resposta a esse problema não pode ser a desculpabilização do insucesso nem tão pouco dizer que a matemática é fácil e divertida."
Em linhas gerais, é esse o caminho que tem sido seguido ou se alargam as estatísticas para servir os propósitos de "inclusão", ou se alargam os métodos para que todos brinquem na sala de aula e ninguém se aborreça. É um método conhecido de todos os que se interessam pelas coisas da educação. Se as notas andam muito baixas, levantam-se as médias; se os alunos não se interessam, aligeiram-se os conteúdos e introduz-se a variante "divertimento na sala de aula". E o mundo ficaria muito mais perfeito.
O governo tem, como todos os outros, os anteriores e os que lhe seguirão (lamento informar o senhor primeiro-ministro, mas haverá mais governos depois deste), um problema com as estatísticas. Geralmente, e muito surpreendentemente, as estatísticas atrapalham os números e, sobretudo, os bons números. Um dos processos para contrariar esta desobediência das estatísticas é o de impedir que elas "excluam"; pelo contrário, devem "incluir". Se há notas muito negativas a matemática, ou a, digamos, física-química, um dos processos que pode ser usado é o de subir as notas ou moderar os critérios de classificação. Logo, fica muito mais gente "incluída" e as estatísticas melhoram. Se há "abandono escolar", acabar-se com os chumbos por faltas pode ser um processo "facilitador". Acontece que o papel das autoridades não é o de serem "facilitadores" de coisas que não podem ser facilitadas, sobretudo quando são exaradas lá do alto, dos corredores do Ministério da Educação. Uso a palavra "corredores" porque qualquer responsável do ME sabe que se trata de um labirinto onde tudo se perde. Os pais sabem, às vezes tardiamente, os bons professores sabem, por muitos anos de experiência, que "facilitar as coisas" pode mostrar um mundo perfeito. Mas o mundo perfeito não existe. Eu entendo bem os pedagogos visionários e utópicos, que prevêm que com divertimento e tolerância tudo se arranja e o mundo ficará melhor. Mas não fica. Não vai ser. Pensamos que basta dar o exemplo, ler, ouvir música, usarmos computadores, sermos tolerantes - e generosos, educados, prestáveis, interessados. Com isso o mundo seria melhor. Mas não basta, infelizmente não basta. Com isso, os adolescentes das escolas seriam pessoas melhores, não usariam aquela gramática de grunhos, não faltariam às aulas, não desdenhariam dos professores que se esforçam e lhes ensinam a diferença entre o culto e o inculto, o cru e o cozido, o bem e o mal. O mundo seria perfeito. As famílias seriam honradas, pacíficas, passeariam ao domingo, fariam piqueniques, todos ajudariam a arrumar a cozinha e dormiriam a horas. Os nossos filhos leriam Dickens e Eça - ou, na pior das hipóteses, arrumariam os livros nas estantes. Interessar-se-iam por ciência e por política. Eu bem os entendo - mas não basta. É muitas vezes necessário ser cruel, usar a autoridade quando não se quer, dizer "não" quando até poderíamos dizer "sim", pensar no que significa, de facto, a palavra exigência. A vida não é fácil. Não nos basta sermos o que somos. É preciso pensarmos nisso - que a vida não é fácil e que aprender exige esforço. A democracia, que transformou as escolas em "estabelecimentos de ensino", como se fossem "lojas do cidadão", tem de resolver esse problema. Para ver se a escola volta a ser escola".

Francisco José Viegas
JN

segunda-feira, dezembro 17, 2007

segunda-feira, dezembro 10, 2007

Doutores e Engenheiros

"É com tristeza que comunico ao auditório o nosso 37º lugar no PISA. O programa da OCDE que permite enxovalhar-nos não ficou impressionado com os nossos conhecimentos científicos, linguísticos e matemáticos. Entre 57 países, ocupamos a terceira parte da lista, abaixo da média e muito atrás da Finlândia, que continua a liderar o barco. Como explicar esta sazonal vergonha? O Ministério da Educação, em atitude que se aplaude, não cede ao populismo fácil de quem aconselha mais estudo nas referidas matérias. Para o Ministério, o problema está na "disfunção" do sistema, que persiste em "reter" os nossos jovens quando a atitude mais sensata seria aprová-los com distinção. Nas palavras corajosas de Jorge Pedreira, secretário de Estado-adjunto, "a retenção não é normal" (Freud, naturalmente, discordaria). Espera-se que o Ministério aprenda a lição e, a partir do próximo ano, faça o que lhe compete: no início da escolaridade obrigatória, entregar a cada criança um diploma universitário. E depois enviar o retrato para a OCDE. Se o PISA não se espanta com um país de poetas, talvez respeite um Portugal precocemente coberto por doutores e engenheiros".

João Pereira Coutinho
Expresso

domingo, dezembro 09, 2007

Violência nas escolas

"Li num jornal que a senhora ministra da Educação está contente. E, quando os nossos governantes estão contentes, é como se um sol raiasse nas nossas vidas.
E está contente porque, segundo afirmou, a violência nas escolas portuguesas, afinal, não existe.
Ao que parece, andamos todos numa de paz e amor, lá fora é que as coisas tomam proporções assustadoras, os nossos brandos costumes continuam a vingar nos corredores de todas as EB, 2/3, ou como é que as escolas se chamam agora. Tenho muita pena de que os nossos governantes só entrem nas escolas quando previamente se fazem anunciar, com todas as televisões atrás, para que o momento fique na História. É claro que, assim, obrigada, também eu, anda ali tudo alinhado que dá gosto ver, porque o respeitinho pelo Poder é coisa que cai sempre bem no coração de quem nos governa, e que as pessoas gostam de ver em qualquer telejornal.
Mas bastaria a senhora ministra entrar incógnita em qualquer escola deste país para ver como a realidade é bem diferente daquela que lhe pintaram ou que os estudos (adorava saber como se fazem alguns dos estudos com que diariamente se enchem as páginas dos jornais) proclamam. É claro que não falo daquela violência bruta e directa, estilo filme americano, com tiros, naifadas e o mais que houver.
Falo de uma violência muito mais perigosa porque mais subtil, mais pela calada, mais insidiosa. Uma violência mais "normal". E não há nada pior do que a normalização, do que a banalização da violência.
Violência é não saberem viver em comunidade, é o safanão, o pontapé e a bofetada como resposta habitual, o palavrão (dos pesados) como linguagem única, a ameaça constante, o nenhum interesse pelo que se passa dentro da sala, a provocação gratuita ("bata-me, vá lá, não me diga que não é capaz de me bater? Ai que medinho que eu tenho de si", isto ouvi eu de um aluno quando a pobre da professora apenas lhe perguntou por que tinha chegado tarde).
Violência é a demissão dos pais do seu papel de educadores - e depois queixam-se nas reuniões de que "os professores não ensinam nada". Porque, evidentemente, a culpa de tudo é sempre dos professores - que não ensinam, que não trabalham, que não sabem nada, que fazem greves, qualquer dia - querem lá ver? - até fumam.
Os seus filhos são todos uns anjos de asas brancas e uns génios incompreendidos.
Cada vez os pais têm menos tempo para os filhos e, por isso, cada vez mais os filhos são educados pelos colegas e pela televisão (pelos jogos, pelos filmes, etc.). Não têm regras, não conhecem limites, simples palavras como "obrigada", "desculpe", "se faz favor" são-lhes mais estranhas do que um discurso em Chinês - e há quem chame a isto liberdade.
Mas a isto chama-se violência. Aquela que não conta para os estudos "científicos", mas aquela da qual um dia, de repente, rompe a violência a sério. E então em estilo filme americano. Com tiros, naifadas e o mais que houver".

Alice Vieira
Jornal de Notícias

sábado, dezembro 08, 2007

Professor denuncia ruína do ensino profissional

Entrevista ao "Expresso" de um professor aposentado que, há semanas atrás, em carta enviada ao Presidente da República, denunciava a fraude que constituem os cursos do CEF (cursos de Educação e Formação).

"Qual o motivo que o levou a recorrer ao Presidente?
Recorri ao Presidente da República por ser quem nos representa e quem deve saber tudo o que se passa no país. E é preciso que o país saiba que tipo de filhos estão as famílias portuguesas a criar e que os professores estão cansados, desanimados, desautorizados e com vontade de arranjar outra ocupação. Os professores estão transformados em amanuenses, obrigados a preencher papelada e mais papelada, e dentro da sala de aula a sua “luta” não é ensinar mas manter os alunos quietos, calados e se possível atentos. O PR tem o direito, o dever e a obrigação de perguntar ao Governo que sucesso é esse tão apregoado no ensino. Escrevi-lhe, também, em nome dos que não podem falar, porque é preciso que se saiba que as escolas estão preocupadas não com a transmissão de conhecimentos mas em “levar” os alunos até ao mês de Junho, de modo a poderem ter um diploma. Transformaram-se em “carimbadoras” de certificados, servindo-se das assinaturas dos professores para dar cobertura legal a esta mentira e a este engano que são os Cursos de Educação e Formação (CEF). Parece estar toda a gente muito feliz e contente a ver passar o cortejo onde o rei vai rotunda e adiposamente nu.

Porque só agora escreveu?
Tive, no ano passado, e pela primeira vez, turmas dos Cursos de Educação e Formação (CEF). Foi um grande choque ver a indiferença com que estes frequentadores da escola encaravam a sua actividade de estudantes (não lhes fica bem o nome de “alunos”, porque um aluno tem um compromisso com a escola e o objectivo de aprender). Estes frequentadores da escola aparecem nas aulas sem trazer uma esferográfica ou uma folha de papel. Trazem o boné, o telemóvel, os “headphones” e uma vontade incrível de não aprender nem deixar aprender.

Admite que a situação que viveu possa ser um problema localizado a esse ano ou a esse grupo de alunos?
Dos perto de 500 “mails”, chamadas telefónicas e mensagens de telemóvel que recebi, fiquei com a informação de que esta informação é geral. O comentário mais comum é de admiração por eu ter descrito exactamente o que se passa nas suas turmas. Muitos dizem-me que pensavam que isto só acontecia com eles e agradecem-me por tê-los ajudado a verificar que, afinal, não estão loucos. Eu mesmo senti, numa aula, que devia ter desembarcado num outro planeta, ao ver os alunos numa grande algazarra, como se a sala de aula fosse uma extensão do recreio. Apenas uma professora me diz que os cursos de jardinagem funcionam bem numa escola de Loures.

Na sua opinião, qual o nível de conhecimentos com que os alunos saem dos CEF?
Não sei qual o nível de aprendizagem noutras componentes, mas em Física e Química mostram um desconhecimento atroz de assuntos básicos. Não sabem que um livro corresponde a um decímetro cúbico, não sabem converter centímetros em metros e vice-versa. Pensam que se passa de minutos para horas andando com a vírgula para a esquerda. Se lhes der a velocidade de um móvel não sabem calcular a distância percorrida ao fim de um certo período de tempo. E o mal não é o desconhecimento, pois a minha função era eliminá-lo. O mal residia no facto de esses conhecimentos não serem assimilados por maior que fosse o meu esforço. Como se consegue ensinar alguém que está sempre a enviar mensagens de telemóvel? Mas o espírito dos CEF é este: se o aluno não aprende “a+b”, basta que aprenda apenas “a”. Se não aprende “a”, basta que aprenda metade de “a”, e se não aprender “metade de a”, basta que aprenda a milésima parte. É por isto que um diploma destes cursos é um atestado de ignorância e incompetência. E quando um empregador perguntar: “Quem foram os professores que disseram que tu sabias, quem foi que te deixou passar?” estará em causa o prestígio de toda uma classe e todos deveremos sentir vergonha.

O seu pedido de passagem à reforma está relacionado com esta experiência nos CEF?
A minha aposentação resultou da reunião das condições de tempo de serviço e de idade necessárias para o efeito. Mas há muitos professores que se querem reformar antecipadamente por que não aguentaram mais.

Estava à espera do impacto que teve a sua carta?
Sinceramente, não!. Escreveram-no contando histórias de arrepiar: desde o professor que aos 52 anos se vê obrigado a ir pela primeira vez ao psiquiatra, sabendo perfeitamente que o seu mal é a escola, até à professora que tentou suicidar-se não sabe se terá forças para tornar a entrar numa sala de aula. Lembro-me, também, de uma senhora me ter dito que tão ou mais grave do que as alterações do clima são as alterações de comportamento e a perda de valores por parte de uma geração que não está preparada para o futuro".

quarta-feira, dezembro 05, 2007

Relatório do PISA 2006

Os resultados do PISA foram conhecidos e com eles vieram as más notícias para Portugal: continuamos na cauda da Europa e por lá devemos permanecer nos próximos anos. Tudo normal. Nada que nos espante. Tem sido sempre assim, pelo que, outro cenário que não este, é que seria motivo para nos deixar surpreendidos.
Quem parece ter ficado bastante desiludido foi o sub-secretário de Estado adjunto da Educação, Jorge Pedreira, para quem esta má performance dos alunos portugueses se deve às reprovações inúteis e injustas que vão acontecendo com demasiada frequência, por força da irredutibilidade de muitos professores que tardam em perceber a mensagem de que os “chumbos” devem ser encarados como uma solução extrema e de último recurso e não como uma prática corrente. Ora se no entender do digníssimo sub-secretário de Estado adjunto, a melhoria dos resultados nas provas internacionais passa por acabar com as reprovações, é de prever que, no sentido de reforço desta tese, as escolas venham a ser invadidas, muito proximamente, com despachos normativos a impedir as retenções. A bem ou a mal, urge que os professores aprendam, de uma vez por todas, quem é a voz da razão. A bem da nação!