"Nem por uma vez, uma vezinha que fosse, ouvimos o primeiro-ministro, o ministro das Finanças ou outro qualquer representante governamental fazer o acto de contrição que se impunha: assumir que a culpa deste estado de coisas não é só da conjuntura, não é só de uma crise sem precendentes nas últimas décadas, mas que também é deles, sobretudo deles, que ajuizaram mal o impacto e o timing das medidas de restrição impostas aos portugueses, que assobiaram para o ar quando meio mundo os prevenira (mas nós não, nós pensávamos ser possível aguentar o barco sem salpicos de água, mesmo quando todos os chamados países periféricos recolhiam as velas e agarravam-se aos baldes).
A culpa, dizia, é deles, que adoptaram uma política autista, salvaguardada em estudos internacionais de circunstância, moldados ao conceito que mais interessava propagandear.
O ar combalido com que José Sócrates e Teixeira dos Santos surgiram perante as câmaras de televisão não condiz com o perfil de homens informados e inteligentes, atributos que até os figadais adversários lhes reconhecem. Pode ter-lhes doído realmente serem portadores de uma pequena tragédia colectiva, mas nem um nem outro devem demitir-se da quota-parte de responsabilidade no naufrágio. Teixeira dos Santos dormiu mal, José Sócrates sentiu um aperto no coração. Mas nenhum deles exibiu o mais pequeno sinal de arrependimento. Porque na hora de expiar culpas, é sempre mais cómodo atacar os mercados, os especuladores, as agências de rating, os bancos.
Os políticos, não. Porque os políticos são emissários divinos que agem com firmeza, imbuídos de um espírito de sacrifício que só eles assimilam. Eles exigem que as pessoas compreendam, mesmo que lhes custe. Mas as pessoas, essa entidade universal que eles usam para encher a boca de intenções, não querem aceitar. Não querem compreender.
Porque as pessoas, as que votaram e não votaram neles, sabem que aqueles que nos conduziram a este estado comatoso serão os mesmos que nos vão guiar no futuro próximo.
E aí reside a suprema perversão: mesmo que nos custe, só os temos a eles para nos salvar".
A culpa, dizia, é deles, que adoptaram uma política autista, salvaguardada em estudos internacionais de circunstância, moldados ao conceito que mais interessava propagandear.
O ar combalido com que José Sócrates e Teixeira dos Santos surgiram perante as câmaras de televisão não condiz com o perfil de homens informados e inteligentes, atributos que até os figadais adversários lhes reconhecem. Pode ter-lhes doído realmente serem portadores de uma pequena tragédia colectiva, mas nem um nem outro devem demitir-se da quota-parte de responsabilidade no naufrágio. Teixeira dos Santos dormiu mal, José Sócrates sentiu um aperto no coração. Mas nenhum deles exibiu o mais pequeno sinal de arrependimento. Porque na hora de expiar culpas, é sempre mais cómodo atacar os mercados, os especuladores, as agências de rating, os bancos.
Os políticos, não. Porque os políticos são emissários divinos que agem com firmeza, imbuídos de um espírito de sacrifício que só eles assimilam. Eles exigem que as pessoas compreendam, mesmo que lhes custe. Mas as pessoas, essa entidade universal que eles usam para encher a boca de intenções, não querem aceitar. Não querem compreender.
Porque as pessoas, as que votaram e não votaram neles, sabem que aqueles que nos conduziram a este estado comatoso serão os mesmos que nos vão guiar no futuro próximo.
E aí reside a suprema perversão: mesmo que nos custe, só os temos a eles para nos salvar".
Pedro Ivo Carvalho
JN
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