segunda-feira, julho 03, 2006

A controversa ministra e o estado do ensino em Portugal

"Desde que Maria de Lurdes Reis Rodrigues assumiu o cargo de Ministra da Educação, o ensino, no nosso país, não tem dado mostras de ter saído do estado comatoso em que se encontra.. É evidente que a senhora ministra com as desfocadas políticas educativas introduzidas, não teve como escopo os alunos, mas, tão-só, preocupou-se mais com os professores considerados como o “bode expiatório” de políticas erráticas e desajustadas do Ministério. Estamos no final do 3º período e já se poderá verificar que a infeliz e peregrina ideia de tentar “prender” os professores na escola para além da componente lectiva, revelou falta de bom senso e falta de imaginação no atacar dos problemas que, verdadeiramente, afligem o ensino no nosso país. Para além da medida ressumbrar laivos de autoritarismo, ainda hoje a srª ministra insiste, de forma infeliz, em atribuir, exclusivamente, o insucesso escolar aos professores quando as causas desse insucesso são bem mais complexas. Na verdade, não é sobrecarregando os docentes para além do aceitável, que o ensino melhorará com medidas avulsas e bem intencionadas, mas de eficácia reduzida ou nula. Os alunos já dispõem do seu horário com as diversas disciplinas. A razão de os professores “existirem” está directamente relacionada com as disciplinas que, equilibradamente, leccionam. Por sua vez, os nossos alunos têm uma carga horária exagerada, como já reconhecia o ex-ministro da Educação, David Justino. De lembrar que o doutor David Justino era favorável a uma redução da componente lectiva nos horários dos alunos (fusão de algumas disciplinas, desaparecimento de outras, etc), mas ninguém teve a coragem política para implementar e/ou reformular os currículos, afim de se reduzir essa carga lectiva que, hoje, contribui ainda mais, para o insucesso escolar. Para além de, não nos esqueçamos, uma escola massificada proporcionar e gerar sempre bastante insucesso escolar. Que se poderá atenuar ligeiramente, aqui e ali, mas estará omnipresente. A excelência não se dá bem em escolas massificadas e superlotadas. Poder-se-á mesmo acrescentar que ”o facto de os alunos no nosso país apresentarem um desempenho pouco satisfatório em termos de comparações internacionais, para além das ineficiências intrínsecas do processo educativo nacional, parece estar fortemente correlacionado com o baixo nível médio de qualificação dos pais e também com a menor riqueza do país. Ou seja, factores que não poderão ser facilmente alterados no curto prazo “---- vide ,” Razões para o fraco desempenho dos alunos portugueses” de António Afonso e Miguel St. Aubyn, professores de Economia no ISEG / Universidade Técnica de Lisboa. Mesmo citando o estudo destes docentes, convirá não esquecer que a escola (irracional) pública apresenta horários que vão das 8.30 h às 17.30, perfazendo mais de 36 horas de aulas. Depois ainda se desejam aulas de apoio destinadas a alunos que não ligam nada e o que querem é brincadeira? Salas de estudo? Centros de explicação? Com que tipo de alunos e a que horas?Mas, serão todas as medidas que a srª ministra quer levar por diante, descabidas e desajustadas da realidade? Naturalmente que não. O reforço das aulas de Matemática e a introdução do Inglês nos primeiros anos de escolaridade serão, a priori, medidas ajustadas desde que salvaguardados determinados requisitos. Já as aulas de substituição nos actuais moldes não se justificam e têm sido um fiasco. Outra boa medida será a revisão da formação académica dos professores (é de lembrar que há formação para todos os gostos e feitios, em instituições e organismos diversificados quer a nível de exigência e rigor, quer a nível de formação pedagógica), a monitorização dos métodos utilizados na sala de aula e a aprovação do alargamento dos cursos tecnológicos e profissionais. Estas medidas se forem levadas a sério--- veja-se o flop e o logro que, de uma forma geral, têm constituído os designados cursos do PIEF (Programa Integrado de Educação e Formação) frequentados por alunos problemáticos e insubordinados e o PEETI (Plano para a Eliminação da Exploração Infantil) de ineficaz e reduzido proveito para os alunos---, serão bem vistas pelos professores e terão a aprovação dos mesmos. Como será de enaltecer a introdução de medidas urgentes que visem obstar a passagem de alunos, mormente aqueles que provêm das escolas primárias e ingressam no ciclo sem, praticamente, saberem ler e escrever e sem conseguirem efectuar operações de multiplicação e divisão! E depois transitam para o 3º ciclo com enormes dificuldades de aprendizagem. A gravidade acentua-se, qual efeito dominó, no ensino secundário onde, nos alunos, são visíveis e detectáveis enormes défices no conhecimento/formação ou nas competências/raciocínio lógico. Dificuldades que continuam a projectar-se no ensino superior e no ensino universitário. Ou seja, a formação dos nossos jovens é deficitária e não corresponde ao pretenso sucesso educativo que o Ministério apregoa e tenta fazer passar. E, depois, o paradoxal acontece. A mão-de-obra na construção civil, nos trabalhos mais pesados e sujos que ninguém quer e todos evitam é assegurada pelos ucranianos, por cidadãos vindos de Leste (muitos deles com formação universitária!), enquanto muitos portugueses sem formação específica ou com parcas habilitações literárias recebem subsídio de desemprego (para não trabalharem), dilatando a despesa do Estado. A juntar a esta realidade deparamos com a pretensa obrigatoriedade dos jovens frequentarem a escola até ao 18 anos, o que se afigura um erro, visto que muitos jovens andam iludidos, sem verdadeiro apego ao estudo, permeáveis à mandranice e ao vício, quando bem cedo deveriam ser orientados para a frequência dos cursos tecnológicos e profissionais, sabendo-se de antemão, que, neste aspecto, o Ministério da Educação também não tem capacidade de resposta para a formação de milhares de jovens que, desta forma, se vêem obrigados a depender economicamente dos pais, enquanto procuram um emprego ( que não existe ) ou, então, decidem emigrar para a Espanha, França, Holanda, Suiça, Inglaterra, Canadá... Enquanto isso os trabalhadores de Leste e das nossas ex-colónias ocupam os lugares que, em princípio, lhes estariam destinados. Não admira, pois, que Francisco Sarsfield Cabral, no “Diário de Notícias” do passado dia 16 de Novembro do pretérito ano, afirmasse que “ os portugueses rejeitam muitos postos de trabalho que lhes são oferecidos em Portugal. Estes têm, assim, de ser ocupados por imigrantes. Mas aceitam trabalhos desses no estrangeiro, onde são mais bem pagos “.Esta é um pouco a realidade laboral e social do país. E, como esta realidade não fosse preocupante, tem-se assistido, continuamente, a uma ofensiva da srª ministra da educação contra os professores (onde está a solidariedade da ministra para com os docentes quando estes são agredidos pelos alunos e pelos pais desses mesmos alunos?). Nas medidas que a srª ministra tem executado, “ esqueceu-se” de uma realidade: a indisciplina e a violência que grassa nas escolas -- numas mais, noutras menos---, e a desconcertante falta de autoridade dos professores. Neste aspecto, convirá lembrar à srª ministra que o governo inglês defende que os professores precisam de ter mais direitos para lidar com os estudantes indisciplinados para poder castigá-los adequadamente. E em Portugal, srª Ministra, o que está a ser feito? Nada, não é? Para a socióloga Maria de Lurdes Rodrigues o que é imprescindível e necessário é “ reter”, “aprisionar” os professores nas escolas para mostrar aos pais dos alunos--- esquece-se que os docentes também são pais---, que os professores até trabalham, essa privilegiada(?) e rica classe(?) que nada faz a não ser dar aulas ...E, não satisfeita, a srª Ministra vai sacrificando os professores que, por razões óbvias e naturais, foram, ao longo dos anos, obtendo redução no seu horário de trabalho, presenteando-os, agora, com- um- inimaginável- horário- igual- àquele -que -tinham -em –início- de -carreira! Que paciência, que motivação, que capacidade física e psíquica terão estes professores para suportarem a insolência, a má educação, a indisciplina e a violência da escola democrática massificada, escola onde o professor é sistematicamente desrespeitado, desautorizado, insultado e, por vezes, agredido! Para além das viaturas dos docentes, em muitos casos, serem vandalizadas nesta sanha juvenil ,com riscos, fortes amolgadelas, pneus furados, vidros partidos... Os pedagogos oficiais do ministério da educação e a equipe ministerial não se convencem de que a escola não pode colmatar todas as falhas da sociedade que o poder político não pode ou não sabe resolver. E insistem nas medidas desconexas e irrealistas.Por isso, enquanto se persistir na desconfiguração da profissão dos docentes, tentando reduzi-los à condição de tarefeiros, “palhaços” para entreter meninos e meninas, burocratas, auxiliares de educação ou tapa-furos; enquanto o Ministério ignorar que a violência, a indisciplina e o mau comportamento perturba sobremaneira o desenrolar das aulas; enquanto se persistir na falta de autoridade do professor e este estiver espartilhado e maniatado na sua acção ; enquanto este Ministério persistir, sob a tutela da socióloga Mª de Lurdes Reis Rodrigues, na ofensiva contra os docentes, amontoando-os nas escolas durante várias horas à espera de Godot, travestido no almejado (in)sucesso educativo, o mal-estar e a crispação nas escolas continuarão. Pretender sucesso educativo, lato sensu, no ensino democrático massificado será o mesmo que pretender que o novo Airbus A 380 tente atingir a Lua...à outrance.Compreensívelmente não é congelando as progressões nas carreiras, nem é aumentando a idade de reforma para os inaceitáveis 65 anos ou mais !?? (com os alunos delinquentes, insubordinados e insolentes que temos!?), nem é alterando, para pior, o Estatuto da Carreira Docente que se encontrarão, nas nossas escolas, professores motivados, satisfeitos e empenhados. A abulia, o desencanto e a revolta têm alastrado e os professores não deixam ( nem deixarão) de se sentir humilhados e ofendidos na sua dignidade profissional.Acresce que os nossos alunos, de uma maneira geral, continuam a não interiorizar hábitos de estudo, de trabalho sério, sacrifício, exigência, empenho e dedicação. E, como não interiorizam, a culpa gruda-se nas costas largas dos professores que não sabem lidar com os meninos, muitos deles provindos de famílias problemáticas e desestruturadas... Enquanto isso, os docentes desesperam e sentem-se desconsiderados porque a escola portuguesa tem sido um enorme armazém lúdico-recreativo onde os pais depositam os filhos (que podem fazer o que muito bem lhes aprouver) para mortificarem os professores. Entrementes, o aluno continua(rá) no “trono”, o professor no “inferno”, o ministério, em particular, continuará demencialmente a aplaudir, enquanto vai prosseguindo a sanha persecutória em relação aos professores, e os políticos, na generalidade, continuarão, bojudamente, a divertir-se com a “tourada” educativa. Tourada educativa que eles criaram e continuam a patrocionar."


*António Cândido Miguéis
Professor
Vila Real

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