"Já aqui escrevi esta ideia, mas, à medida que os membros do Governo vão perdendo a compostura, volto a ela: há gente para quem o país seria um local muito melhor caso não houvesse jornais.
Se possível, o país não teria também quaisquer associações que não fossem dirigidas de acordo com os superiores interesses da Nação, os quais, naturalmente, seriam devidamente interpretados pelo Governo. Esta harmonia, milenar e indossolúvel, condiziria o país a ganhos incalculáveis em todos os domínios, mormente o da educação. A verdade seria o que o Governo diz, sem contradições nem adversativas.
Maria de Lurdes Rodrigues, quando culpou a comunicação social pelas más notas a Matemática (Valter Lemos viria depois culpar uma sociedade de Matemática e um seu membro em concreto, que é colaborador deste jornal), começou a percorrer esta trilha. O que se pode dizer quando uma ministra pensa - e di-lo publicamente - que a culpa de notas baixas num exame é da imprensa? Provavelmente não se pode dizer nada, porque tudo o que se venha a afirmar corre o risco de ser manifestamente desagradável.
Seria, provavelmente, demasiado duro e injusto afirmar que a ministra gostaria de governar sem ter a maçada de prestar contas a jornais e de ver publicadas opiniões diversas e opostas à sua.
Para quem está num Governo que tanto criticou a gaffe de Manuela Ferreira Leite sobre a suspensão da democracia, digamos que esta ideia é bem pior. Para a ministra, não se trata de uma suspensão mas de uma sentença definitiva. Há jornais? Que maçador! Provocam inúmeros males, entre eles a baixa de notas a Matemática!
Não serei eu a dizer que do Ministério da Educação só saíram erros (tiveram méritos no Inglês, nas aulas de substituição, na estabelização dos contratos dos professores, etc). Mas é manifesta a desorientação da equipa. Não foi só o modo desastrado e totalmente cego como conduziram o dossiê avaliação (no qual havia razão do seu lado), nem o modo sarrafeiro como um secretário de Estado (da Educação) fala habitualmente.
Este episódio - os dois lado a lado, a queixarem-se do mundo por terem baixado as notas - é o retrato do trabalho que fizeram. O Ministério não quer avaliar conhecimentos (que de ano para ano estão sujeitos a flutuações normais)! Nada disso! Quer apenas fazer um gráfico estatístico! Se os resultados baixam, há culpados! Mas porquê? Por haver mais exigência? Por haver menos conhecimentos?
Claro que não! Apenas porque se decompõe o gráfico!"
Henrique Monteiro
Expresso
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