domingo, outubro 28, 2007

As lições que a escola vai dando

"Há sempre boas explica­ções gara tudo. Para o fim das faltas justifica­das nas escolas o secre­tário de Estado da Educação ar­ranjou uma bem simples: as faltas, disse ele, levavam a que os alunos chumbassem e ficassem parte do ano sem escola, numa situação insustentável. Ao mes­mo tempo, muitos pais justifica­vam fraudulentamente as faltas dos filhos. Era preciso acabar com isso.
Decretou-se mais exigência? Não! Decretou-se o fim da dife­rença entre faltas justificadas e injustificadas.
Doravante, um aluno com fal­.tas a mais (seja por doença seja por estar num centro comercial a fumar cigarros) sujeita-se a uma prova, especial para ele, que pesará na avaliação final o que o professor entender.
Enfim, entende-se que os miú­dos não podem andar aí pelas ruas, em vez de estarem nas es-
colas. Quando faltam, a escola notifica os pais e prepara-lhe a prova 'de recuperação'.
Isto, no fundo, deve-se à - per­doe-se-me a expressão, mas não vejo melhor - baldá total nas es~ colas. Dá-se de barato q~ há alunos que faltam. E como as re­comendações do Ministério (e as necessidades estatísticas) im­pedem o chumbo (perdão, a re­tenção do aluno) ia tudo passan­do de ano, mesmo sem saber ab­solutamente nada, a menos que faltasse demais.
Com as provas de 'recupera­ção' acaba-se este ciclo. A partir de agora o aluno faltoso deve fa­zer a prova. Se tiver boa nota, as faltas não interessam para nada; se tiver má nota, não se percebe bem o que acontece, uma vez que a retenção (vulgo chumbo) não e coisa que se faça, pelo me­nos no ensino obrigatório.
E, assim, as nossas adoráveis crianças descobrirão que faltar p"ode bem ser a forma mais fácil
de passar de ano. Não chumbam nem são excluídas da escola e an­dam na rua à mesma! Depois lá fazem um testezinho e pronto! Imagine-se o diálogo de um pai com o filho:
- Andas a faltar à escola?
- Não faz mal, eu faço a prova de recuperação.
E assim se passam valores pa­ra a"vida. Pena devem ter os tra­balhadores de não terem génios destes à frente das suas empre­sas. Faltar quando apetece e, de­pois, trabalhar um bocadinho ­nada que afecte as meninges ou o físico; nada que afecte o salá­rio contratado.
São lições que se ganham nas nossas escolas vítimas do fardo 'eduquês' dos legisladores.
Por mim, já nem tenho espe­rança na salvação. Quem pode, tem os filhos nas escolas priva­das; quem não pode, aguenta; quem não sabe, é excluído. A exi­gência é uma palavra banida des­te sistema educativo".

Henrique Monteiro
Expresso

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