1. Quando, em dois de Janeiro passado,
antecipei nesta coluna o descambar da situação do país, logo no fim do primeiro
trimestre da execução do orçamento de 2013, não fui original. Tão-só acompanhava
a voz dos que não acreditavam que algum dia os porcos voassem. Aumentou o
desemprego. Cresceu o défice e a dívida. Galoparam a recessão e o sofrimento dos
portugueses. E, enquanto a realidade evidencia que nenhum problema foi resolvido
e todos se agravaram, há quem diga, de cara dura, que é uma questão de tempo,
que sim, que os porcos voarão.
2. Crato regressou da sua viagem à volta da
Terra, em 14 dias, depois de a troika ter aviado a sétima avaliação. Fez bem.
Assim, a troika decidiu por ele, sem lhe perguntar se concordava com a chuva.
Nada do que se passa, aliás, depreende-se das declarações do ministro à chegada,
tem a ver com ele, porque, disse, “… o mundo está a mudar muito depressa …”, “…
a situação política é volátil …” e, além disso, “… não há nenhum ministro que
decida tudo por si…”. Querem razão mais científica e tempo mais propício para um
saltinho à China, Chile e Brasil?
3. E que se passa, afinal?
Em Março de 2010, sob a epígrafe “Europa 2020 –
Estratégia para um Crescimento Inteligente, Sustentável e Inclusivo”, a Comissão
Europeia desenhou um plano de revitalização da sua economia, que considerava
indispensável diminuir a taxa de abandono escolar precoce para 10 por cento e
elevar para 40 por cento a dos diplomados com o ensino superior, na faixa etária
dos 30 aos 34 anos.
Dados estatísticos, recentemente divulgados por
David Justino, no âmbito de um trabalho que desenvolve no seio do Centro de
Estudos de Sociologia da Universidade Nova de Lisboa, revelam que a Taxa de
Abandono Escolar (percentagem de jovens dos 10 aos 15 anos, que nunca
frequentaram o ensino básico ou que o abandonaram sem concluir o 3º ciclo) se
cifra em 1,7 e que a Taxa de Abandono Precoce (percentagem da população com
idade compreendida entre os 18 e os 24 anos, que não frequentou o ensino
secundário ou o abandonou sem o ter concluído) se fixa em 27,1. Estes dois
indicadores, expressos em números absolutos, significam, respectivamente, 11 mil
417 e 220 mil 472 indivíduos.
Pois é neste contexto que o Governo anunciou a
passagem ao regime de mobilidade especial, modo eufemístico de mascarar o
despedimento posterior, de 10 mil professores, que se somam aos 15 mil já
dispensados este ano, tudo a acrescer a uma perda de rendimento da classe
(considerado o aumento da carga horária) da ordem dos 30 por cento e a um
concurso, em preparação, a reger por regras próprias dos tempos feudais. É sem
uma réstia de pensamento estratégico para a Educação nacional e políticas
centradas na destruição acéfala do que se conseguiu, e foi muito, apesar dos
erros, que procuramos o futuro? É com professores mal pagos (não me venham
contradizer com dados da OCDE, inflacionados por níveis salariais do último
escalão da grelha salarial congelada, onde não há um único professor, e
referidos a tempos anteriores aos cortes brutais dos últimos anos), apavorados
pela ameaça do desemprego, desnorteados pela legalidade em construção, que lhes
pode fixar o local de trabalho a mais de 300 quilómetros da residência e os
sujeita a mais ignominiosas iniquidades, sempre introduzidas por cada uma das
sucessivas alterações aos diplomas de concurso, sem visão de conjunto, que
ajudaremos a economia a endireitar-se? É lançando na selva do mercado de
trabalho jovens sem as qualificações básicas exigidas pela Europa, que
combatemos a sua taxa de desemprego, a rondar já os 50 por cento? É cruzando os
braços ante mais de dois milhões de activos, que não concluíram o ensino
secundário, que melhoraremos a competitividade da nossa economia? Resolveremos o
défice e a dívida cortando, sem critério nem visão, no essencial, a educação e a
formação de um povo? Obliterados pela pressão do urgente, continuaremos a
regredir no importante?
Num estudo recente promovido pela Comissão
Europeia, Portugal e Roménia são os únicos estados que reduziram as despesas
públicas com a educação, em percentagem do PIB. Consignando-lhe 3,8 por cento de
um PIB que caiu para valores próximos dos 152 mil 156 milhões, quando, em 2010,
gastávamos 5 por cento de um PIB que se cifrava em 167 mil e 500 milhões,
Portugal reduziu, neste curtíssimo período, 2 mil 594 milhões de euros com a
educação. No memorando assinado com a troika, em Maio de 2011, fixavam-se os
cortes em 195 milhões, em 2012, e 175 milhões, em 2013. A resposta às perguntas
que formulei acima foi dada pela comissária europeia para a Educação, quando
apresentou o estudo: “Se os estados-membros não investirem suficientemente na
modernização da educação e das competências, ficaremos aquém dos nossos
concorrentes mundiais e será mais difícil combater o desemprego juvenil”.
Santana Castilho
Sem comentários:
Enviar um comentário