quinta-feira, junho 12, 2008

O prestígio perdido dos professores

"Um estudo de João Ruivo, citado no “Público”, em 6 de Junho de 2008, alerta-nos para o facto de quase metade dos professores não voltarem a escolher esta profissão pela falta de prestígio e reconhecimento social. Passa novamente a merecer honras académicas um fenómeno social que desde há muito corre nas bocas do mundo e de que importa procurar razões.
Isto porque um outro estudo de Braga da Cruz (publicado em 1990) já nos tinha dado conta do facto dos professores do ensino primário, em reconhecimento público, ocuparem a 8.ª posição e o professor do ensino secundário a 14.ª, entre 20 profissões estudadas. Reminiscências do tempo em que o médico, o padre e os então chamados professores primários eram as pessoas mais prestigiadas nas aldeias?
Mas esta erosão do prestígio e reconhecimento das profissões não se confina a fronteiras docentes ou nacionais. Com fundamento no que se passa nos Estados Unidos, para João Lobo Antunes, médico neurocirugião e catedrático de Medicina, “apesar dos progressos maravilhosos da ciência médica, a verdade é que o respeito que a confiança que nós, neurocirurgiões, e os médicos em geral, merecemos do público leigo tem declinado substancialmente” (“Um modo de ser”, Gradiva, Lisboa, 1996, p. 43).
Seja como for, é altamente preocupante não ser, agora, unicamente “o público leigo”, mas os próprios usufrutuários da profissão docente a exprimirem este estado de desalento que contrasta com os hinos de louvor cantados pela professora universitária Clara Pinto Correia aos antigos professores do liceu (segundo ela, “mesmo que liceu seja uma palavra que já não se usa, dá jeito, no caso vertente, para simplificar o discurso”), quando escreveu: “A barbárie não anda longe. Nunca andou (…) Para evitar que assim seja temos nos professores do liceu a mais importante das nossas armas. Devíamos beijar-lhes as fímbrias do manto” (“Diário de Notícias”, 22 de Outubro de 1995).
Para o rasgar das fímbrias do manto julgo ter contribuído um Estatuto da Carreira Docente (do ensino não superior) que meteu no mesmo saco todos os docentes, do ensino infantil ao secundário, sem ter em devida conta as respectivas habilitações académicas, quer fossem a nível do ensino médio ou ensino superior. Aliás, princípio seguido pelos sindicatos dos professores da altura ao permitirem a inscrição de qualquer um que desse, ainda que esporadicamente, aulas sem qualquer espécie de habilitação que o creditasse ou mesmo enquanto estudante de um qualquer curso superior (ou nem isso).
Corria o ano de 1992. Em desacordo frontal com este “statu quo” foi criado o Sindicato Nacional dos Professores Licenciados com os objectivos seguintes:
- “Defender os interesses específicos dos professores licenciados por universidades que eram, e continuam ainda a ser, postergados pela administração e ignorados pelos outros sindicatos e suas federações.
- Representar a ruptura com as orientações sindicais existentes, em oposição frontal à instituição de uma carreira única de professores, pois pretende revalorizar a profissão em todo o seu percurso, em consonância com os valores e as necessidades dos professores dos nossos dias” .
Numa verdadeira manta de retalhos de formações académicas, muitos outros se seguiram numa profusão de sindicatos de professores a puxarem a brasa à sua sardinha, que não encontra qualquer semelhança no associativismo sindical de mesteres nobilitados por ordens profissionais. Ainda que acompanhada de um repetitivo discurso de bondade, a união de 14 sindicatos dos professores numa plataforma comum apenas deve ser vista como a crisálida de uma espécie de unicidade sindical desajustada no tempo e sem lugar nas circunstâncias da nossa actual vivência democrática".

Rui Baptista

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