"O projecto de resolução do PSD sobre a avaliação de professores e sobre o estatuto da carreira docente foi, como se previa, ontem viabilizado no Parlamento: bastou para isso a abstenção do PS. Os diplomas da restante Oposição foram obviamente chumbados. O que deseja o PSD? Que o Governo acabe com a divisão da carreira em duas categorias e que crie um novo modelo de avaliação no curto prazo de 30 dias. Mais: os sociais-democratas reclamam que, no primeiro ciclo avaliativo, prestes a terminar, não haja professores penalizados em termos de progressão da carreira.
É preciso pensar muitas vezes antes de perceber o alcance da estratégia escolhida pelo PSD: o principal partido da Oposição resolveu um dos mais sérios problemas que o Executivo tinha pela frente. Em troca recebeu uma mão cheia de nada. Claro que pode sempre dizer-se que o PSD teve sentido de Estado e pôs os interesses do País à frente dos seus próprios interesses. Sucede que isso não corresponde à verdade. Por isto: se o Governo - como, aliás, é previsível - não conseguir responder no espaço de um mês às exigências definidas pelos sociais-democratas, acontece o quê? Acontece que o PSD averba uma derrota política.
O novo líder parlamentar social-democrata não vê a coisa assim. Argumenta Aguiar-Branco: se isso acontecer, o PSD terá ainda mais legitimidade para apresentar "um projecto alternativo de avaliação". Quer dizer: Aguiar-Branco está convencido de que o "projecto alternativo" terá margem para vingar no Parlamento. Há uma triste ingenuidade neste solene pensamento: os restantes partidos da Oposição não estarão obviamente interessados em aprovar o que quer que venha do PSD, depois do "frete" feito ao Governo. Nem o PS estará obviamente interessado em voltar um mês atrás e esquecer todo o trabalho entretanto feito.
Pacheco Pereira, o grande pensador social-democrata, percebeu bem o problema. E já foi avisando que o partido terá um problema, se os 30 dias não trouxerem o que o PSD quer... Se Pacheco Pereira o diz, Manuela Ferreira Leite devia ouvi-lo. Ou talvez não, dados os resultados recentemente obtidos pelo partido sempre que a líder social-democrata seguiu os conselhos daquela proeminente figura da democracia nacional...
A atitude do PSD nesta matéria da Educação revela ainda um outro facto de enorme importância. A ideia que dá é que o PSD não está disposto a esticar já a corda, de modo a evitar que o Governo se possa vitimizar perante o País. Esta estratégia traz um risco associado: a incoerência. É que a mansidão e o alegado sentido de Estado agora defendidos contrastam bastante com o estilo "guerreiro" e destrutivo (por vezes exageradamente destrutivo) que Ferreira Leite, provavelmente aconselhada por Pacheco Pereira, escolheu como marca da sua liderança.
Bem sei que a ex-ministra das Finanças começou por ser acusada de nada dizer ao país, de se manter quieta e calada na São Caetano à Lapa (terá também sido Pacheco o teorizador desta estranha postura?). Mas não esqueçamos que, a seguir, o rumo mudou radicalmente. Ferreira Leite passou - e várias vezes bem - ao ataque directo ao primeiro-ministro. O espaço de tempo, apesar de tudo curto, em que tudo isto aconteceu deve trazer muitos sociais-democratas um pouquinho atarantados. Eu só vejo uma possibilidade de análise a tudo isto: Ferreira Leite passou a ouvir mais Aguiar-Branco do que Pacheco Pereira".
Paulo Ferreira, JN
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