"É espantoso o corrente espanto por causa do bullying. Houve um tempo, não muito remoto, em que a escola servia propósitos de disciplina e instrução. Nos intervalos, as crianças trocavam sopapos e, desde que as consequências não excedessem o ocasional sobrolho aberto, nem os pais nem os professores lhes atribuíam importância. Importante era que os fodelhos exibissem maneiras junto dos crescidos e assimilassem uns rudimentos de português e aritmética no processo.
Um belo dia, os sábios da educação decidiram que a disciplina e a instrução eram conceitos castradores, ultrapassados e, vá lá, socialmente fascistas. Daí em diante, a escola dedicar-se-ia a asseguarar que os meninos e meninas fossem eles próprios e não, como pelos vistos acontecia antes, outros quaisquer. Nascia o ensino "centrado" nas crianças, no qual a autoridade sumiu e o professor passava a também aprender com os alunos. O pormenor de ninguém ter nada para ensinar não demoveu os sábios, entretidos a elaborar programas repletos de "competências", "valências" e demências afins, no fundo a conversa fiada que escondia ou legitimava mediante fraude uma prosaica realidade: a morte da escola enquanto tal.
Hoje, o substantivo define um edifício onde se armazenam petizes e se garante que a má-criação e o analfabetismo adquiridos em casa não sofrem perturbações. Se calhar, não vale a pena discutir se a escola imitou a família ou vice-versa. Vale perceber que ambas ergueram as crianças ao topo de uma sociedade bárbara, em que os incontáveis medos irracionais não incluem o medo da boçalidade e da ignorância. A singela preocupação que as veneradas criaturinhas suscitam é a segurança. É segurança o que os pais exigem que a escola forneça, e não os padrões comportamentais ou intelectuais que eles mesmo desprezam. E é segurança que a escola se esforça por fornecer, inevitavelmente com duvidoso sucesso. O bullying ou, em língua de gente, a agressão, é uma expressão natural dos pequenos (e dosgrandes) selvagens e, num meio em que tudo concorre para os manter assim, a expressão única. O que é que esperavam?"
Alberto Gonçalves
Sábado
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