quarta-feira, junho 13, 2007

Quem quer implementar mudanças tem de ter os professores consigo

"Tom Schuller é o director do Center for Educational Research and Innovation, um organismo da OCDE para as questões da Educação. Veio ao Porto para apresentar uma conferência, na Fundação Serralves, na qual defendeu os benefícios sociais de aprender. Nos últimos anos, tem estado relacionado com diversos cargos de aconselhamento político. Neste momento, faz parte da "Comissão para o debate nacional sobre o futuro da escola", instituída pelo primeiro- -ministro francês.

Veio ao Porto defender a ideia de que, "quanto mais qualificados formos, mais tempo vivemos". Ao JN, aceitou falar um pouco mais sobre as mudanças que se impõem aos sistemas educativos.
Jornal de Notícias Os estudos feitos pela OCDE revelam que, apesar dos investimentos e mudanças feitos no sistema educativo português, os resultados continuam muito aquém do desejado. Consegue compreender a razão disso?
É verdade que Portugal está um bocado atrás de muitos países da OCDE e outros países europeus. Uma razão possível é o facto de as mudanças em Educação serem lentas, os resultados virem mais tarde. Sabemos que Portugal tem uma proporção reduzida da sua população no Ensino Superior, apenas 10%, quando a média da OCDE é de 20%. Portanto, há ainda um longo caminho a percorrer.
Há países, como a Irlanda, que apostaram na Educação como trampolim para implementar o desenvolvimento económico. Acredita que uma aposta na Educação pode ser o ponto de partida para uma mudança bem sucedida?
Penso que a Irlanda é um exemplo, de facto, muito interessante. O sucesso não terá sido devido apenas a uma aposta na Educação, porque tiveram uma política geral económica muito bem sucedida. As alterações no sistema educativo tiveram o seu papel. Mas preocupa-me que se dê grande relevo à Educação, porque quer ao nível económico, quer ao nível social, a Educação por si só não produz os resultados necessários. A Finlândia é o exemplo mais conhecido devido aos excelentes resultados obtidos nos estudos do PISA. Contudo, a Finlândia não teria sido tão bem sucedida se a Nokia não tivesse ajudado a sua economia...
Portugal tem um nível de desemprego muito elevado. De que forma ele poderá comprometer a obtenção de melhores desempenhos no sistema educativo?
Pode, na realidade, ser algo complexo. Por um lado, se o desemprego é grande, as pessoas ficam mais tempo no sistema de ensino, porque não arranjam emprego. Mas se a economia é forte, as pessoas abandonam os estudos porque arranjam trabalho com facilidade. E o desemprego não é bom para a economia, prejudica o Estado e afecta os investimentos em Educação.
E são muitos os licenciados no desemprego. Não lhe parece um desperdício de formação?
De facto, é uma situação estranha. É verdade que leva algum tempo para um licenciado arranjar emprego, às vezes há licenciados que não aceitam qualquer tipo de trabalho e a economia não produz os postos de trabalho que os licenciados gostariam de ver criados. Mas de facto é estranho como em países com um número reduzido de licenciados haja um tão elevado número de desempregados.
Custa ver licenciados nas caixas dos supermercados, não é?
É verdade. Mas é uma situação bem pior de aceitar quando esse licenciado ainda ali se encontra um ou dois anos depois de ali ter entrado. Aí as coisas já são mais complicadas..
Muitas vezes, são os próprios industriais que recusam admitir técnicos com formação superior, porque isso implica pagar melhores salários...
Isso é uma verdade. Os empregadores portugueses terão de ter em conta que o sucesso de uma economia depende de mão-de- -obra com boa formação. E trabalhadores bem habilitados não se coadunam com postos de trabalho mal remunerados. Para além do mais, um trabalhador com formação superior tem um leque maior de conhecimentos e, assim, uma capacidade maior de adaptação.
Voltando às mudanças na educação, considera a formação de professores como essencial às melhorias no sistema educativo. Conquistar a classe docente é um passo importante para o sucesso?
É crucial. Devo realçar que conheço pouco sobre a carreira dos professores em Portugal, portanto isto não é um comentário ao que se passa aqui. De um modo geral, quem pretende implementar mudanças num sistema educativo necessita ter os professores consigo. Isto não significa que se tenha de fazer o que os professores acham que deva ser feito. Os países que implementaram mudanças nos últimos 5 a 10 anos são países que pensaram mesmo a sério na formação de professores.
Ao desenhar uma carreira docente, é importante oferecer aos professores algo que considerem compensador?
Muito importante. Houve países que mudaram para uma carreira diversificada, em que os professores são compensados, alguns podendo progredir mais rapidamente na carreira. No Reino Unido, passou-se por um período difícil, com dificuldades na recrutação de professores. Agora há muitas pessoas com boas graduações que seguem a carreira docente porque sabem que serão recompensados se trabalharem bem.
Portanto, a avaliação do desempenho é indispensável?
A avaliação, o apoio aos professores na formação em serviço, mas também um julgamento sobre como estão a desenvolver o seu trabalho, provando que existe uma diferença nas compensações dadas aos bons e maus professores.
As escolas devem poder escolher o seu corpo docente?
Sim, devem ter a capacidade de escolher os professores que querem ter, sem ter de ficar à espera que o governo central decida em seu lugar. Defendo um certo grau de autonomia quer no recrutamentos dos professores, quer na aplicação dos currículos.
Na era das novas tecnologias, cada vez mais sofisticadas, as escolas sentem dificuldade em competir com elas em termos de seduzir os jovens. Partilha da ideia?
Não sei se elas deviam tentar competir. Temos um projecto - o "New Millenium Learners" - que procura saber como um sistema educativo responde quando um jovem usa as diferentes tecnologias para aprender, jogar e comunicar. Uma escola não pode competir. O que procuramos é ver como essa relação entre o "fora da escola" e o "dentro da escola" pode ser construtiva, mais do que encontrar uma barreira entre as duas.
Para um jovem, uma máquina pode ser mais estimulante do que um professor, não?
Sim, é possível, mas isso depende da qualidade do professor. Isto faz-nos pensar o que estamos a dar aos alunos. Podemos dar uma boa aprendizagem, ensiná-los a fazer um bom uso das tecnologias, mas isto não significa converter a escola num salão de jogos. Agora, é claro que manter alunos sentados simplesmente a ouvir um professor dificilmente trará bons resultados.
Depois, a escola tem ainda de dar resposta à infinidade de problemas sociais que ali entram...
É um desafio enorme para as escolas. E elas não podem resolver tudo. Às vezes, quem trabalha em educação tende a exigir demais da escola. E não se pode deixar tudo aos professores para resolver. A escola não é um local apenas para professores. Outros profissionais - como assistentes sociais - são ali necessários. As escolas precisam de fazer um trabalho de proximidade com outros tipos de unidades de apoio social".

Jornal de Notícias

1 comentário:

Paideia disse...

Não constitui grande novidade; j´´a Dewey o afirmava em 1901...